De 1999 a 2014 : O que houve com o câmbio brasileiro?

Regimes cambiais são regras estabelecidas para a formação da taxa de câmbio em um país. Existem diversos tipos de regimes que podem ser adotados por um país,em que os mais conhecidos são os regimes de câmbio fixo e também o de câmbio flutuante, embora também existam outros tipos intermediários, como o câmbio flutuante sujo, “bandas cambiais”, entre outros .

Países que adotam o regime de câmbio fixo são aqueles em que o Banco Central possuí taxas de câmbio pré-fixadas e intervém frequentemente com políticas monetárias a fim de atingirem este preço da moeda estrangeira já estabelecida. Nestes a política monetária feita pelo Banco Central é passiva. Já países que adotam um regime cambial flutuante são aqueles em que o Banco Central não intervém no mercado cambial, ou seja, apenas “assiste” as alterações dos preços da moeda estrangeira.

No caso brasileiro, o mais certo é dizer que o país possuí uma política cambial flutuante suja, pois apesar de o câmbio flutuar e não ter valores fixados, o Banco Central intervém na economia para tentar reduzir a volatilidade do câmbio, ou seja, para tentar amenizar as oscilações do preço do real se comparado ao preço da moeda estrangeira ( lembrando que trataremos apenas do dólar como moeda estrangeira ).

Neste artigo, analisaremos as variações cambiais ocorridas no país desde que o Brasil passou de um regime de câmbio fixo para o de câmbio flutuante sujo. Iremos analisar não apenas os valores da taxa de câmbio, mas também o porque das desvalorizações ou valorizações cambiais durante o período de 1999 ate o atual período de 2014.

No dia 15 de janeiro de 1999 o Banco Central deixou o câmbio flutuar. Este que estava cotado por 1,21 antes da flutuação atingiu 2,16 no mês de março do mesmo ano, mostrando grande desvalorização do real frente ao dólar. Esta depreciação se deu principalmente pela incerteza quanto a mudança do regime cambial, o que leva a um aumento da desconfiança externa quanto ao futuro do país trazendo menos investimentos externos, e consequentemente uma menor entrada de dólares no país. Em meados de 1999, quando as características de um regime flutuante começaram a se concretizar, onde o Banco Central só interviria na economia para reduzir a volatilidade cambial e raramente para auxiliar as necessidades de financiamento do balanço de pagamentos, a taxa de câmbio também começou a se estabilizar e permaneceu sem muitas alterações até o início de 2001.

Porém, a partir do primeiro trimestre de 2001 o preço do dólar disparou no Brasil. No dia 21 de setembro deste mesmo ano a taxa de câmbio chegou a 2,80 , valor extremamente alto. Os principais motivos que contribuíram para esta desvalorização do real foram a crise argentina e também a recessão americana. A economia argentina influencia diretamente a economia brasileira, pelo fato de que ambos são fortes parceiros econômicos e que possuem diversos acordos ,além de manterem fortes relações de trocas de mercadorias, e de pertencerem a um mesmo grupo econômico : o Mercosul. Logo, é fácil ver que crises econômicas na Argentina pode ser um  indicador de que o Brasil pode ser o próximo a entrar em crise, além de reduzir as exportações do país visto que a Argentina é uma grande importadora brasileira. Portanto, o Brasil não só passou a receber menos investimentos pelo aumento da desconfiança externa devido ao repasse da queda na expectativa brasileira pelos acontecimentos argentinos  mas também teve sua balança comercial piorada, o que significa também menor entrada de dólares. Já a recessão americana influenciou o Brasil pelo aumento da incerteza em todo o mundo, além de taxas de juros maiores nos EUA, atraindo mais investimentos para a América do Norte. A fim de amenizar esta depreciação o Banco Central realizou a venda de parte das suas reservas internacionais, conseguindo apreciar um pouco o real.

Porém este cenário não durou por muito tempo. A partir de meados de 2002 o real voltou a depreciar e o principal motivo foi a incerteza quanto a política econômica que seria adotada com possível eleição de Luis Inácio Lula da Silva. Em 22  de outubro de 2002 a taxa de câmbio chegou a 3,95, valor impressionante. Dia 27 de outubro Lula foi eleito como presidente do país com 53 milhões dos votos e no dia 28 de outubro houve uma pequena apreciação e o câmbio fechou o dia em 3,74. Ao longo do seu governo foram sendo verificadas políticas econômicas mais conservadoras e com ambições mais altas, como metas elevadas de superávit primário e busca pela queda da inflação, o que fez que as expectativas do governo fossem superadas e então o risco e desconfiança em relação ao Brasil começou a cair, atraindo dólares e investimentos, e apreciando o real.

De 2003 até 2005 não houveram fatos muito marcantes no mercado internacional e nem ações frequentes do banco central. A taxa de câmbio flutuou mais livremente neste período, porém lembrando que o Banco Central intervêm de certa forma com compras/vendas de reservas e também com as swaps cambiais.

Em 2006 o FED ( Banco Central Americano ) elevou as taxas de juros nos Estados Unidos por causa de um aumento significativo da inflação no país causado em grande parte pela elevação do preço do petróleo. Como já falamos, com taxas de juros mais altas no exterior, investimentos que poderiam ser destinados ao Brasil tem seu rumo alterado pela maior perspectiva de lucro fora. E com isso houve mais uma vez uma depreciação do real em 2006, porém esta foi mais controlada pelo BC.

Em 2007 o cenário continuou desfavorável para nosso país, por causa de um início da crise americana que fez surgir uma aversão internacional ao risco, reduzindo os investimentos no Brasil.

Porém em 2008 a crise americana se intensificou e para tentar controlar a péssima situação americana o FED injetou grande quantidade de moeda na economia o que levou a uma redução nas taxas de juros americanas, além de uma maior quantidade de moeda em circulação no mundo o que contribui para um aumento de empréstimos e investimentos. Com esta redução dos juros americanos, tornou-se mais vantajoso investir no Brasil em muitos casos, por este possuir taxas de juros mais elevadas, mesmo sendo um país de maior risco. Logo, visando maiores retornos muitos investidores trouxeram seus investimentos para o Brasil, o que levou a uma maior entrada de dólares no país, e uma apreciação do real, que permaneceu por volta de 1,55 em 2008, tendo pequenas oscilações.

Em 2009 , 2010 e 2011 pelos mesmos motivos citados acima ( situação ruim da economia americana ) e também por um aumento da taxa selic brasileira o real manteve-se apreciado .

Em meados de 2012 este cenário começou a ser modificado. E em 2013 foi concretizada uma grande desvalorização do real. Existiram vários motivos causadores dessa depreciação. Um deles foi a queda da taxa selic para 7,5% o que fez com que fosse menos atrativo investir no Brasil. Outro e um dos principais deles foi a melhoria da economia americana que fez com que o FED reduzisse os estímulos monetários nos EUA .Desta forma menos dinheiro circulou naquela economia, reduzindo quantidade de moeda para empréstimos e investimentos. Além de que com a recessão americana as taxas de juros lá aumentaram, e taxas de juros mais altas em um país extremamente seguro de se investir como os Estados Unidos é garantia de maior entrada de investimentos na América do Norte e menos no Brasil. Tudo isto foi o bastante para que o câmbio ficasse entre 2,20 e 2,45 em 2013.

Já neste ano de 2014 presenciamos dois tipos de situações diferentes. A primeira delas foi no início do ano até meados de março, quando o real continuava bastante depreciado, próximo de 2,40. Isto ocorreu pelos maiores cortes na oferta de moeda americana e também com as notas negativas recebidas pelo Brasil na Standards & Poor’s em relação a capacidade do país de pagar suas dívidas, levando a um aumento da desconfiança externa .  Porém, houve um segundo cenário a partir do fim de março onde com a queda da aprovação da presidente Dilma Rousseff as ações brasileiras valorizaram, mais investimentos entraram no Brasil e o real sofreu uma apreciação, estando atualmente por volta de 2,22.

Esta retrospectiva nos mostra que ações intervencionistas do Banco Central podem ser úteis para amenizar variações cambiais, mas na maioria das vezes não são tão eficiente devido a imensa quantidade de fatores externos que influenciam a todo instante a economia doméstica. Trocas de ativos financeiros, mercadorias, e até mesmo informações e notícias causam muitas alterações nas variavéis macroeconômicas de um país. Por isso não vale a pena pensar que políticas monetárias exageradas e frequentes demais são a solução para o controle da economia de um país. Muito pelo contrário

.Image

 

Gráfico gerado pelo Banco Central

https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=trocarGrafico